quarta-feira, 16 de abril de 2008

Cílios e petulância

Cai lá fora uma chuvinha gostosa e eu me espreguiço na cama, enrolando mais e mais meu corpo nu nos lençóis macios cheirando a lavanda. Deve ser tarde. Mas não estou nem aí. Agora, sozinha na cama, acabo de decretar o meu day off. Hoje eu mereço desfrutar da minha própria companhia e estico o mais que posso esse momento gostoso. Ainda sem abrir os olhos, no lento acordar dos sentidos, alongo o corpo feito gata e, nesse movimento, noto que meus seios estão sensíveis. Também, pudera, o Juca é tão amarrado neles que passou boa parte da noite passada literalmente mamando em mim. Quer dizer, em mim e no copo de whisky que ele não desgrudou a noite inteira. Primeiro foi naquela festa careta onde me levou, cheio de mulheres com cara de Barbie velha com bocão, e homens de ar imponente.

Ele insistiu que fossemos a tal recepção que o diretor da sua empresa daria ao manda-chuva global. Dizia que estava na hora de me apresentar aos seus colegas da corporação. Estamos saindo há poucos meses, por isso estranhei o convite, uma vez que não faço parte desse mundo business. Entretanto, uma vez na festa, compreendi porque ele fez questão de me levar lá. Afinal, não deve ser toda hora que ele se envolve com uma mulher interessante, original e, se não belíssima, pelo menos com alguma coisa para falar além dos assuntos de todas as rodas ali: praia, antidepressivos, técnicas de preenchimento e academia. Ah, e ia esquecendo, outro tema em voga naquela chatice era “competitividade”. Vendo de fora aquele mulherio, talvez elas estivessem competindo para ver quem tinha o cabelo mais lugar-comum do lugar. Afinal, todas tinham o mesmo tipo de corte, tintura, e o mesmo ar blasé de quem acha que está arrasando. E vai ver que estavam. Nada contra, eu é que devia estar fora de lugar.

Depois do segundo drinque eu não agüentava mais ficar lá dentro, e ainda por cima sozinha, uma vez que o Juca, depois de me apresentar a todos como uma jóia rara, estava mais era entretido em fazer relações diplomáticas com os gringos. Eu me esforcei, juro, mas após algumas tentativas patéticas, simplesmente desisti de tentar manter algum papo com um mínimo de sentido, pelo menos para mim.

Como faço sempre quando entediada, parti para um joguinho que faço sempre nessas horas. Vasculhei a sala, procurei, procurei, e não via ninguém interessante, nem mesmo para um flerte bobo, desses de festa. Dentre todos (e todas) ali, só se salvava um dos garçons, um moreno alto, magro, olhos cheios de cílios e um ar safadinho que, literalmente, me encantou. Por segundos que fosse, ele sustentava o meu olhar cada vez que eu procurava o seu.

Até que estava divertido, mas eu não podia ficar ali só flertando o garçon. Então comecei a passear por aquela casa imensa, admirando as obras de arte espalhadas pelos cantos, paredes e móveis. De fato, o diretor tinha ali um acervo incrível de arte contemporânea e da melhor qualidade. Cheguei mesmo a achar que ele fosse um conhecedor. Ou então que a fulana que cuidou da decoração da sua nova casa (e que vive aparecendo nas colunas sociais) tenha ido se aconselhar com um bom marchand ou galerista. Sinceramente, eu apostaria mais nessa hipótese.

Estava na sala anexa ao grande salão, entretida nesses pensamentos quando o tal moreno veio, decidido, em minha direção com a bandeja.

- Está servida, senhora? O que deseja? , disse-me ele, encarando-me de forma provocativa. Não tive dúvida e respondi baixinho, também olhando em seus olhos:

- ....o seu telefone, disse eu.

- É pra já, senhora, vou providenciar, respondeu com um discreto sorriso, virando-se para servir outras poucas pessoas que estavam por ali.

Definitivamente o rapaz tinha atitude, gostei. E fiquei por ali, me divertindo, tentando imaginar como ele faria para me entregar “a encomenda”. Nem cinco minutos se passaram, e ele estava de volta, trazendo uma bandeja com outro tipo de whisky.

- Com gelo, senhora?

- Três pedrinhas, por favor, respondi.

Em seguida, com toda elegância, ele me serviu o copo, em cuja base havia um pequeno papel azul, todo dobradinho. Peguei no copo com muito cuidado para o bilhete não cair, e logo o escondi na outra mão. Não via a hora de ver o que estava escrito. Fiquei por ali um tempinho e, depois de alguns goles, circulei procurando pelo banheiro mais próximo, ansiosa .

“Não demore. 9999-9999 . Carlos”. Foi uma injeção de adrenalina. Não consigo resistir a homens imperativos. Ele que me aguardasse. Aquilo me deixou cheia de tesão, e mais impaciente ainda para sair logo dali. Imediatamente passei a caçar o Juca com os olhos daquele jeito que ele não consegue resistir. Deu tão certo que ele logo começou a se despedir do pessoal e, em pouco tempo, estávamos na minha cama fazendo aquele tipo de sexo bom, porém meio burocrático, bem ao seu estilo. Mas, desta vez, sem que Juca soubesse, tivemos um terceiro participante. E os lençóis quase pegaram fogo.

4 comentários:

Y.N. Daniel disse...

É o que eu suspeitava,
VOCÊ É UMA GLAMUROSA!

GLAMUROSA, RAINHA DO FUNK,
PODEROSA OLHAR DE DIAMANTE
NOS ENCANTA E NOS FASCINA
AGITA O SALÃO
BALANÇA GOSTOSO
REQUEBRANDO ATÉ O CHÃO

Excelente!

Helena Pessin disse...

Naníssima !!!!
UAU !!!! Atrevida maravilhosa ! Vamos emfrente , quero ler mais e TODOS os dias !!!!!!
beijão

Bruno Cobbi disse...

Delicada sem ser bancar a santinha, sensível sem ser melosa e feminina sem ser vulgar.

Ganhou mais um visitante!

=]

Lu Faria dos Anjos disse...

Nanete,

Adorei seu texto, solto, livre autêntico, sem preconceitos. É tudo que as pessoas pensam e não têm coragem de dizer ou fazer. Parabéns, você o faz de maneira íntegra, sem ser vulgar. Sucesso pra você, acho que já encontrou seu estilo!
Beijos da Libélula!